Memórias da Banda Desenhada Nº172 
Por Jorge Magalhães | O Louletano, 8 de Junho de 2009

Aperfeiçoando cada vez mais a sua técnica, Blasco construiu uma narrativa elíptica, com "flash-backs" e acções paralelas, sem descurar o sentido rítmico da montagem, cla­ramente cinematográfica (veja-se, por exemplo, a luta entre Cuto e Urso Vermelho, o filho de Wa'oka, coreografada com grande fluidez de movimentos).

Sob os traços fortes e vigorosos de Jesús Blasco, desfilam também, num fundo panorâmico (pouco usual nas histórias aos quadradinhos da época), as solitárias paisagens do velho Oeste — serenas e majestosas, mesmo quando servem de palco ao desalento de Cuto, profundamente abalado pela morte trágica do velho Slim — e os índios, os búfalos, as diligências, os cavaleiros galopando através da pradaria.

Contada quase em forma de balada, "Nos Domínios dos Sioux" é uma história que associa a aventura ao romantismo, o drama à epopeia. Só muitos anos mais tarde a BD "western" alcançaria, na Europa, um nível estético, lírico e temático análogo a esta memorável criação de Jesús Blasco.

Apesar da enorme popularidade que conquistara entre os leitores d'O Mosquito, Cuto ia seguir novos rumos. Algum tempo depois de terminar "Nos Domínios dos Sioux", deu-se uma repentina cisão entre os dois directores e fundadores da revista, António Cardoso Lopes e Raul Correia. O primeiro perdeu o título, mas ficou com as oficinas da Travessa de S. Pedro, em Lisboa, onde em finais de 1948 começou a imprimir o seu novo sonho: O Gafanhoto.

O n° 10 anunciava com grande destaque o regresso de Cuto... mas um Cuto diferente, que envergava garbo­samente um uniforme de auxiliar do Exército Americano — outra espantosa metamorfose, atendendo à sua idade juvenil. "Cuto em Nápoles" (história já publicada no nosso jornal) era mais uma abordagem de Blasco à 2ª Guerra Mundial, tornando ainda mais concreta a relação de Cuto com a história do seu tempo e com os Aliados, ao serviço dos quais voltaria a aparecer em "Estrela Negra" e "O Junco de Sing".

Cardoso Lopes sabia que Cuto era um excelente trunfo para O Gafanhoto, capaz de fazer concorrência ao próprio Mosquito. As tiragens confirmaram-no quando no n° 21 teve início "O Caso dos Rapazes Desaparecidos", uma aventura de cariz policial em que Cuto regressa às origens, isto é, ao cenário urbano, por excelência, dos filmes de "gangsters": Nova Iorque.

O cinema americano foi, aliás, uma das principais fontes de inspiração de Jesús Blasco, que com este trabalho inicia uma série de aventuras mais actuais de Cuto, fundindo um estilo já totalmente amadurecido com o ambiente dos anos 50 e o realismo puro da acção. »»